domingo, 25 de julho de 2010

Hoje estive no inferno




Sabe aqueles dias em que você demora propositalmente para abrir os olhos, fingi não saber que horas são e tão pouco estar ouvindo o som tão doce do alarme de seu celular e pensa umas mil vezes se deve mesmo levantar ou não?
Hoje meu dia começou assim e já era um presságio de tudo que aconteceria e que me faria ter a certeza de ter feito a escolha errada, levantar não fora realmente uma ideia muito boa.
Ao tentar sair do quarto levei uma rasteira do meu cachorro, sim, uma rasteira, passou por entre minhas pernas feito um louco (o que no caso dele chega a ser um pleonasmo) e quase me mandou de boca no chão. Tudo bem dei bom dia mesmo assim e peguei a sua coleira porque o bichinho já estava pronto sentado de frente para a porta só esperando para nosso passeio habitual de todas as manhãs.
Como de costume é sempre ele que me leva para passear me puxando pelo braço com uma força descomunal e literalmente me arrastando pelas ruas da cidadezinha provinciana em que moramos.
Quando voltei para casa fui direto para o banho, onde o sabonete pulou da minha mão já nem sei quantas vezes, troquei de roupa correndo, tomei meu café da manhã bem leve (metade de um x-bacon de ontem ) , me despedi do meu bichinho e corri para a rodoviária.
Dobrando a esquina da rodoviária pude avistar uma fila que já era o rascunho do que viria mais adiante, aguardei uns vinte minutos porque na minha frente tinham simplesmente duas múmias, para não dizer outra coisa mais bonita, que não sabiam se quer se iriam viajar ou não e pelo que pude perceber nem haviam decidido qual destino seguir.
Passado este pequeno pesadelo, comprei minha passagem para Araçatuba, no único ônibus disponível no horário que não era o convencional, portanto, só poderia ser o suburbano e a própria palavra já diz quase tudo, digo quase porque o tudo neste caso é simplesmente indescritível uma vez que é tão surreal, tão abominável, tão triste e revoltante que não existem no dicionário em nenhum idioma palavras capazes de descrever tamanha barbárie e diria até descaso.
Descaso porque dentro de um coletivo, que para em todas as cidadezinhas possíveis e para a qualquer sinal de vida na estrada tudo acontece, menos um tratamento digno, pois os pobres trabalhadores que precisam deste meio de transporte estão sujeitos a todo e qualquer perigo, principalmente porque estando ali realmente não sabem se voltam vivos para casa.
Assim que subi as escadas senti um frio na espinha, sabia que seria mais uma daquelas viagens deliciosas em que você vai em pé, se esquivando daqueles caras bem novos e cheirosos que adoram encostar em qualquer carne fresca que estiver no pedaço. E de fato somos carregados feito animais dentro de um coletivo, feito bois de carga que ao contrário dos verdadeiros não valem absolutamente nada e que a qualquer momento serão arremessados para fora, porque o motorista jamais fará a gentileza de esperar que você termine de colocar a outra perna no asfalto, ainda mais se você já não tiver mais forças e carregar estampado no rosto um sofrimento de anos em meio à miséria e a desesperança.
Assim que pegamos a rodovia já quase cai no colo de uma senhora que por sorte teve um lugar para sentar, teria sido meu se tivesse fingido como muitos que não a vi entrar, na primeira parada entraram mais alguns infelizes, como aquela pobre senhora, que precisam pegar o ônibus todos os dias para trabalhar, ao contrário de mim que estava ali por um mero acaso, pelo menos neste momento da minha vida em que este tipo de sofrimento foi banido da minha rotina, estava ali apenas para ir a pós-graduação, oportunidade que a maioria presente naquele circular jamais terá.
Cada vez que a porta do ônibus abria mais gente subia e isso me deixava ainda mais indignada, porque não cabia mais ninguém, tinha gente saindo pela janela e se mais alguém entrasse teria que ir do lado de fora do teto. Fomos assim, sem poder respirar muito senão o ar não seria suficiente para todo mundo e acreditem as janelas não abriam, se mexer era impossível, se houvesse um incêndio ninguém poderia sair vivo dali.
Fiquei olhando para aquelas pessoas, tão habituadas a serem mal tratadas, mal servidas e desprezadas e não conseguia pensar em outra coisa que não fosse agradecer a Deus que me permite fazer outras escolhas e optar por um caminho melhor, pois hoje estive no inferno, mas pude voltar. E aqueles pobres trabalhadores que não tem nenhuma outra opção? Eles vivem no inferno e talvez jamais saiam dele.

Carol Freitas

11 comentários:

  1. infelizmente querida amiga, isso acontece também entre a nossa querida cidade de araçatuba e a cidade de birigui (creio que você também utilizou desse meio de transporte GS).
    Somos apenas vítimas de um sistema que não funciona, aonde a visão maior dos donos é apenas o LUCRO e não a qualidade do meio de transporte.

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  2. Carol infelizmente isso ocorre todos os dias e, em vários lugares. Já enfrentei muitos dias assim na época da faculdade, e o meu destino era pra Lins. Mas é como você disse, estive no "inferno" porque estava fazendo a escolha por uma caminho melhor, que muitos daqueles que encontramos dentro dos coletivos não têm outra opção, e, hoje, posso dizer que voltei do inferno, rs...Vivo no céu!! Aliás tenho que agradecer a Deus todos os dias, porque tenho meu carro próprio e não estou mais dependente deste meio de transporte, que é uma VERGONHA!!!!!!

    Beijão
    Saudades!!

    Ju Manzatti

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  4. Quando a gente cresce um pouco
    É coisa de louco o que fazem com a gente:
    Tem hora pra levantar, hora pra se deitar,
    Pra visitar parente.
    Quando se aprende a falar, se começa a estudar,
    Isso não acaba nunca.
    E só vai saber ler, só vai saber escrever
    Quem aprender o bê-a-bá.
    E além do abecedário, um grande dicionário
    Vamos todos precisar:

    Com A escrevo amor, com B bola de cor,
    Com C eu tenho corpo, cara e coração.
    Com D ao meu dispor escrevo dado e dor,
    Com E eu sinto emoção!
    Com F falo flor, com G eu grito gol
    E com H de haver eu posso harmonizar.
    Com I desejo ir, com J volto já, com L tenho luar.
    Com M escrevo mão, mamãe, manjericão,
    Com N digo não e o verbo nascer.
    Com O eu posso olhar, com P paparicar,
    Com Q eu quero querer.
    Com R faço rir, Com S sapoti,
    Com T tamanduá, com U Urubupungá.
    Com V juro que vi, com X faço xixi,
    No fim o Z da zebra.


    letras de Toquinho
    E AI ??? O CEBTIMENTO BOM MELHORA TUDO A VIDA E O VIVER >

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  5. Excelente texto, muito bem escrito e de forma formidável.
    Acompanharei sempre, um amigo me indicou e fiquei grato.
    abraços
    Otávio

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  6. A mais pura realidade, infelizmente não vejo uma saída, mostrar a todos a nossa indignação talvez seja um caminho. adorei

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  7. Eu me vi nessa história, passava por isso todos os dias para poder estudar, espero que tenha valido a pena o sacrifício. Como você muito bem disse Carol, eu pude sair desse inferno, mas tem muita gente que viverá pra sempre nele.

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  8. Show de bola Carol!!! Continue postando...mandei e-mail pra vc, tem oficina de literatura no Sesc este mes que vem, aguardamos sua presença.

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  9. Carol, achei você no orkut e vi que tinha criado um blog, fiz teatro com você, aliás até hoje não sei porque parou, adorava sua atuação, mas vejo que nao desistiu de escrever, nem deves fazer isso, adorei, este texto ficou maravilhoso, continua crítica e expondo suas ideias, isso é ótimo.
    Parabéns, espero que agora possamos nos corresponder mais vezes.
    grande abraço

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  10. CAROLZINHA, QUE SOFRIMENTO EIN AMIGA, QQ EH ISSO, HEHEHEH, MAS EH VERDADE NINGUEM MERECE ESSA VIDA DE ONIBUS.. PIOR EH MESMO ESSE DESCASO DO GOVERNO BRASILEIRO Q NAO FAZ NADA PRA NOS AJUDAR, MUITO PELO CONTRARIO, USURPA TUDO O Q CONSEGUE DO JA TAO SOFRIDO POVO BRASILEIRO. AGORA MUDANDO DE ASSUNTO, SE VC VAI MUITO PRA ARAÇATUBA, TENHO UMAS AMIGAS Q TRABALHAM LA E VAO TODO SANTO DIA PRA ARAÇATUBA E VOLTAM, ENTAO PELO PREÇO DA PASSAGEM DE ONIBUS, VC PODE IR DE CARRO COM AR CONDICIONADO E SER DEIXADA NA PORTA DE CASA, SE LHE INTERESSAR PASSO O CONTATO. SE QUISER IR, OU VOLTAR, ACHO Q DA PRA ENCAIXAR VC.... MESMO Q SEJA EVENTUAL, EH OUTRA VIDA IR E VOLTAR DE CARRO, UM GRANDE ABRAÇO PRA VC, DESCULPA A DEMORA PRA POSTAR AKI UM COMENTARIO, MAS MINHA VIDA TA BEM CORRIDA, CORRERIA DEMAIS E DIN DIN DE MENOS, COMO SEMPRE, HEHEHHEE, ABRAÇÃO .!! FIQUE COM DEUS.....

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  11. Tô te seguindo. Te espero no meu blog. bjs.

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